Sexta-feira. Mais um dia de trânsito colossal na cidade de São Paulo. Não chegaria a tempo. Ligo o rádio e começo a ouvir a partida entre Chile e Austrália. Acende a luz no painel e sou obrigado a encostar o carro no primeiro posto de gasolina que surge pela frente. Na hora de pagar, percebo uma pequena TV apoiada na máquina de cartão de crédito. O frentista nota meu interesse e pergunta: “Você viu a paulada que a Espanha tomou?”. Não consigo disfarçar o sorriso de debater sobre Copa do Mundo com qualquer pessoa.
Chego em casa e meu dois filhos estão sentados no sofá com a minha mulher. Roda o DVD daXuxa Só Para Baixinhos. Dramas reais. Penso em sugerir a mudança de canal, mas Matheus, o mais novo, canta as músicas com certa empolgação. Menos mal que tem a outra TV no quarto. Bem menor, mas não era o caso de se apegar a detalhes.
O jogo já estava 2 a 0 para o Chile. Uma festa incrível na Arena Pantanal. Maria Eduarda, a mais velha, ouve o barulho e entra no quarto. “Pai, espera um pouco”. Segundos depois surge com o Álbum da Copa do Mundo e coloca na página do Chile, tentando identificar nos cromos os jogadores que vão aparecendo na transmissão. Quando você tem filhos com pouca diferença de idade, eles basicamente dividem a mesma atenção. Matheus abandona a Xuxa e se pendura no criado-mudo para conquistar também o seu espaço na cama.
Pouco tempo depois estamos lá todos cantando CHI CHI CHI! LE LE LE! CHILE! Matheus acha a página do Japão no álbum e comemora: “Azul, azul, azul”. Deve ter lembrado das cores que acaba de aprender na escolinha. Maria Eduarda fica encantada com os cangurus de pelúcia que surgem nas arquibancadas e perguntas e pode torcer “um pouquinho” para a Austrália, que diminuía o placar naquele instante.
Uma missão árdua nesses últimos dias é equilibrar as funções caseiras com as partidas. Tudo precisa ser extremamente calculado. Dar o jantar no intervalo. Deixar a fralda e a pomada sempre em lugares estratégicos. Antecipar o banho quando a tarde está repleta de jogos. Logo de cara, a Copa se tornou parte dessa rotina familiar.
Aos 47 minutos, os jogadores do banco do Chile invadem o gramado para comemorar o gol de Beausejour. Maria Eduarda pula na cama, Matheus tenta imitar os gestos da irmã. Felizes com aquela festa de cores e sons. “Pai, já sei. No próximo jogo do Brasil a gente torce assim: BRA BRA BRA! SIL SIL SIL! BRA SIL!”. Levanto a Maria Eduarda como se fosse o troféu dourado. Ela entendeu todo o espírito.
Muito se discutiu sobre as possíveis e desejadas heranças antes do início do Mundial. Estamos apenas no quarto dia e tudo indica que o maior legado dessa Copa do Mundo é a própria Copa.
Comentários