Passei muitas noites sentindo pena de mim mesmo/Costumava chorar, mas agora levantei a cabeça/E me tornei outra pessoa. A letra de “I will survive” (“Eu sobreviverei”), da cantora Gloria Gaynor, embalou a torcida da França nos mata-matas da Copa de 1998 – e bem poderia ser a trilha sonora deste time do Brasil. Numa jornada épica e sofrida, ele eliminou o time da Colômbia na sexta-feira. São situações semelhantes. A França era o time da casa em 1998, como o Brasil em 2014. Apesar da vantagem, a dificuldade para superar os adversários no mata-mata é imensa – e isso dá à torcida a sensação de que ela é especialmente importante. Em Fortaleza, 60 mil pessoas abraçaram a Seleção, numa catarse que coroou uma semana em que ela esteve à beira de um ataque de nervos.
Depois do descontrole demonstrado no jogo das oitavas de final contra o Chile, os jogadores do Brasil – com exceção de Neymar, cobrados por desempenhos insatisfatórios na primeira fase – passaram a ser questionados também pela falta de equilíbrio emocional. O choro convulsivo de Willian depois de perder um pênalti – e posteriormente de Júlio César, Thiago Silva, David Luiz e do próprio Neymar, após o alívio da vitória – foi interpretado como sinal de fraqueza do time. Felizmente, o técnico Luiz Felipe Scolari entrou em ação. Há treinadores que ficam conhecidos por ser exigentes e elevar o padrão técnico dos jogadores – casos do espanhol Pep Guardiola ou do brasileiro Telê Santana. Outros são famosos como estrategistas do gramado, como o italiano Arrigo Sacchi ou o holandês Rinus Michels. Felipão é, acima de tudo, um motivador. Sua especialidade é lidar com a emoção dos jogadores. Num momento de crise, ele demonstrou ter nervos de aço.
Se o jogo teve um herói, ele se chama Thiago Silva. Fez o primeiro gol e teve atuação impecável. Ao longo da semana passada, sua condição de capitão foi contestada, por causa da crise de choro antes dos pênaltis contra o Chile. Para muitos, ele transmitia insegurança. Na véspera do jogo contra a Colômbia, disse: “É uma coisa natural essa pressão. Quando a gente se entrega àquilo que ama fazer, é assim”. Thiago também lembrou um dos momentos mais difíceis de sua vida. “Superei a tuberculose, corri risco de morrer, e hoje sou um campeão.” Após fazer o primeiro gol, ele correu rumo à bandeirinha de escanteio, gritou “Aqui é Brasil!” e soltou um palavrão. Os demais jogadores correram para abraçá-lo.
Pela primeira vez nesta Copa, a Seleção entrou em campo fazendo lembrar as atuações da Copa das Confederações do ano passado. Felipão mexeu na equipe e trocou Daniel Alves por Maicon na ala direita. A intensidade e o desespero para abrir logo o placar dentro de campo levaram alegria e raça para as arquibancadas. A torcida empurrou o Brasil durante todo o jogo. O time ganhou mobilidade e força defensiva, capaz de segurar a Colômbia no primeiro tempo. No início da segunda etapa, numa falta cometida pelo craque James Rodríguez, o zagueiro David Luiz, símbolo da raça da Seleção, fez o segundo gol numa cobrança perfeita. A Colômbia ainda diminuiu num pênalti cobrado por James. O jogo se tornou dramático – mas drama é a marca dos jogos do Brasil na Copa. A garra brasileira prevaleceu no final.
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