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A violência venceu?

PERDÃO O menino Waldick, 11, (no detalhe), morto pelo guarda Caio Muratori, em SP. O agente diz que não sabia que era uma criança e que errou a mira ao atingi-la - CLIQUE PARA AUMENTAR

Número de assassinatos no Brasil já supera o registrado em zonas de guerra: são seis homicídios por hora no País. Até quando a sociedade será refém da barbárie?

Gisele Palhares Gouvêa, médica, 34 anos. Waldik Gabriel Silva Chagas, 11 anos. Julio César Alves Espinoza, estudante universitário, 24 anos. Robert Pedro da Silva Rosa, 15 anos. Denilson Theodoro de Souza, 49 anos, segurança do prefeito do Rio de Janeiro. Guerino Solfa Neto, delegado, 43 anos. Nomes que ganharam ampla cobertura midiática na semana passada, mas são apenas o início de uma longa lista, que não caberia completa nas páginas de ISTOÉ: a de pessoas assassinadas no Brasil. São inacreditáveis 160 vidas perdidas no País todos os dias. A relação dessas tragédias cotidianas começa pelo assassinato da dermatologista Gisele, morta com dois tiros na cabeça no sábado 25, enquanto fazia o trajeto entre o serviço comunitário num hospital do subúrbio carioca e sua casa. Passa pelo menino Waldik, 11, assassinado por um tiro disparado por um Guarda Civil Metropolitano (GCM) enquanto estava no banco de trás de um carro, na Zona Leste de São Paulo. E culmina com a execução, pelas mãos da polícia, do estudante Julio César, que teve o carro alvejado com 16 tiros durante uma perseguição, na terça-feira 28, preocupado por estar com excesso de multas. Porém, o cenário de guerra que se tornou o território nacional não termina com essas trágicas históricas, como confirmam as estatísticas. A violência está cada vez mais banalizada e o brasileiro parece ter se acostumado à barbárie imposta pela ausência de políticas públicas eficientes. “O problema é essa Faixa de Gaza que a gente tem aqui no Rio de Janeiro”, disse o cirurgião plástico Renato Palhares, marido de Gisele, no funeral da esposa, na segunda-feira 27. A frase poderia se referir a qualquer lugar do País.

O Brasil hoje protagoniza uma realidade nefasta – é líder mundial em número de homicídios. São 58 mil assassinatos registrados em 2014, índice seis vezes superior à média global. Para se ter ideia da magnitude do problema, basta dizer que o País responde por 10% dos casos do planeta. As estatísticas brasileiras superam nações assoladas por guerras, como Israel, Iraque, Afeganistão e Paquistão. Um estudo realizado pelo Instituto Igarapé revelou que países da América Latina são os mais violentos. “Embora muitas nações vivam conflitos prolongados, a escalada da violência nessas regiões é de tirar o fôlego”, diz Robert Muggah, diretor de pesquisa da organização. Uma em quatro pessoas assassinadas em todo o mundo é brasileira, colombiana ou venezuelana. E as perspectivas são as piores possíveis. “Aqui é a única parte do globo onde as taxas de homicídios estão crescendo.” No Brasil, as regiões mais críticas são Norte e Nordeste, onde a violência só aumenta – correspondem a 52% dos casos de homicídios do País. “Nesses locais começou a circular mais dinheiro e o crime organizado se instaurou, a ponto de ter disputa entre facções”, diz Renato Sérgio de Lima, vice-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Os altos índices de desigualdade, concentração de pobreza, impunidade, o acelerado processo de urbanização, o tráfico de drogas e a repressão policial fizeram a violência disparar no Brasil. Para piorar, em apenas 8% dos casos os responsáveis vão para trás das grades.
Mas como chegamos até aqui? E por que ficamos indiferentes a essas zonas de guerra em que se transformaram nossas cidades? As respostas passam pelo alto número de homicídios em nossas ruas. A quantidade de corpos expostos nas calçadas parece anestesiar qualquer sentido. Mas esse não é o único fator. Professor de ética e filosofia política da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Antonio Valverde afirma que tanto violência quanto sociabilidade fazem parte da natureza humana. “O problema é quando o lado animal fica mais exposto do que o racional.” Por exemplo, quando policiais mataram o menino Waldik, que realizava pequenos assaltos, eles não praticaram justiça, mas vingança. Atropelaram a face racional do homem em favor da animal. Como uma pesquisa recente demonstrou, metade dos brasileiros concorda com a frase “bandido bom é bandido morto”. Por isso, muitos não se sensibilizaram com o assassinato do menor, sem saber que dados sugerem que a letalidade policial, mesmo quando praticada contra infratores, aumenta a criminalidade em vez de refreá-la. A cultura brasileira é extremamente violenta e nos leva a perpetrar comportamentos de fúria. “A violência é uma linguagem cotidiana do brasileiro, é mentira que somos um povo cordial”, afirma o especialista em organizações policiais Rafael Alcadipani, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Mas a culpa pela banalização da violência não recai somente sobre a sociedade. Autoridades municipais, estaduais e federais possuem um enorme dever, mas não fazem nada. Isso ficou demonstrado quando o guarda civil metropolitano Caio Moratori, responsável pelo disparo no menino Waldik, na semana passada, afirmou ter mirado nos pneus do veículo e disse que não sabia que se tratava de uma criança. O depoimento emocionado não o exime de culpa. Porém, a responsabilidade maior por tudo isso é da negligência do Estado, que não o treinou nem o preparou psicologicamente para exercer a atividade policial. Esses casos são recorrentes e apontam para a falência das políticas públicas de combate à violência. A poucas semanas da Olimpíada, agentes cariocas pararam por oito horas em função da falta de água, papel higiênico e até de tinta para imprimir boletins de ocorrência. “Bem-vindos ao inferno”, escreveram, em inglês, numa faixa direcionada aos turistas que chegavam ao aeroporto do Galeão. A ausência de verba é evidente, mas para José Vicente da Silva Filho, coronel da reserva da Polícia Militar, o principal problema é de gestão. “Não faltou papel no Rio por causa da crise, mas por falta de planejamento.” Além disso, há a improdutiva rivalidade entre policiais civis e militares. Porém a raiz da criminalidade é outra. “A principal razão da criminalidade é a desigualdade social tremenda”, afirma Humberto Fabretti, advogado criminalista e membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (Ibccrim). “Precisamos de políticas sociais, não de enfrentamento. Temos que atacar as causas, não os efeitos.”
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Outro problema que concerne ao Estado é a questão das drogas, responsável por mortes como a da médica Gisele. Não é difícil concluir que, mesmo indiretamente, o crime é culpa do tráfico. Afinal, facções dominam a região do acesso da via Dutra à Linha Vermelha, onde ela foi baleada. O cirurgião plástico Renato Palhares, 38 anos, viúvo da dermatologista, disse à ISTOÉ que os assassinos não levaram apenas sua esposa. Levaram o futuro dos dois. “O plano era que ela engravidasse no segundo semestre.” Com voz baixa, mas firme, disse que nunca será pai de Antonio. “Seria o nome do nosso filho. Estou destroçado.” Segundo Vera Malaguti, secretária geral do Instituto Carioca de Criminologia (ICC), a violência do Rio é endêmica e a guerra contra as drogas fracassou. “O que tem acontecido? Mortes de todos os lados”, diz. O Secretário Estadual de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, admitiu à ISTOÉ que este ano o estado registrou aumento de criminalidade, ao contrário do que vinha ocorrendo desde 2006. “No ano passado, fechamos com a taxa de 25,4 homicídios dolosos por 100 mil habitantes.”
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Outro gargalo da segurança pública no Brasil é o mercado de armas ilegais. De acordo com a Polícia Federal, foram roubadas e furtadas 15.617 armas somente em 2015. Além disso, 10.984 armamentos foram perdidos e extraviados (nesta categoria estão as apreendidas pela polícia e depois desviadas) no mesmo período. “O Estado falha no controle das armas”, diz Isabel Figueiredo, ex-diretora da Secretaria Nacional de Segurança Pública. Elas abastecem o crime organizado e caem nas mãos de crianças e adolescentes. O caminho percorrido pelo revólver supostamente utilizado por Ítalo Ferreira de Jesus, 10 anos, outra criança morta pela PM paulista no início de junho, demonstra como um sistema mais eficiente de controle de armas poderia ajudar a reduzir a criminalidade. O revólver Taurus calibre 38 foi roubado em 2005, durante um assalto a vigilantes que faziam a escolta de um caminhão na rodovia Anhanguera. “A polícia deveria não só fiscalizar as empresas de segurança, mas analisar continuamente o perfil da arma apreendida, para conseguir atuar antes que o armamento caia no mercado ilegal”, diz Bruno Langeani, coordenador de Justiça e Segurança do Instituto Sou da Paz.
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A violência faz o Brasil gastar R$ 250 bilhões por ano (5,4% do PIB) com segurança, saúde e potencial produtivo de vidas perdidas, incluindo uma geração de novos brasileiros. “Existem quadrilhas que arregimentam jovens para integrar estruturas criminosas, mas a polícia não as investiga”, diz Bruno Paes Manso, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP). Essa deficiência alimenta o crime. “O Estado falhou drasticamente, temos uma segurança pública que foi pensada na época do regime militar, cujo objetivo é combater o inimigo. Hoje esse inimigo é majoritariamente representado por pobres, negros e jovens”, afirma Átila Roque, diretor executivo da Anistia Internacional.
BANAL Homem corre ao lado de cadáver achado em Copacabana, no Rio. Partes do corpo foram achados ao lado da arena da Olimpíada para vôlei de praia
BANAL Homem corre ao lado de cadáver achado em Copacabana, no Rio. Partes do corpo foram achados ao lado da arena da Olimpíada para vôlei de praia (Crédito:Sergio Moraes/REUTERS)
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