“Todo dia essa guerra aqui em Manguinhos, no Jacaré, no Mandela. Nosso mundo está em perigo, gente. Mãe, eu não aguento mais morar aqui em Manguinhos. Todo dia essa guerra, todo dia gente morrendo. Não aguento mais ficar morando aqui, não aguento. Gente, não aguento mais viver nesse mundo de tiroteio. Não aguento todo dia essa guerra, não aguento mais viver aqui, é muito perigoso viver aqui para mim, quanto mais para vocês. Eu não aguento mesmo”.
O pedido de socorro é de uma menina de 10 anos, moradora de Manguinhos, na Zona Norte. Era noite do último sábado. Sua mãe, uma comerciante de 35 anos, e seu irmão de 15 haviam acabado de sair de casa para irem a um aniversário. Ela ficou em casa com a avó. Sentada no chão da cozinha, com o rosto entre as pernas para abafar o som dos tiros, a menina pegou o celular e, em meio ao choro, mandou as três mensagens de voz para a mãe.
No dia anterior, o policial civil Bruno Guimarães Buhler morreu após ser baleado por traficantes no Jacarezinho, favela vizinha. Desde então, confrontos fazem parte da rotina das duas comunidades. Já são seis dias seguidos de tiroteios. Desde segunda-feira, a menina, que cursa o 4º ano da Escola municipal Negrão de Lima, não vai ao colégio.
— Não mando ela para a escola enquanto essa situação não terminar. É todo dia essa mesma rotina de terror. Ela diz que quer sair daqui. Se eu pudesse, claro que eu já tinha saído. Quantos mais vão ter que morrer para pagar pela vida desse policial? — perguntou a mãe da menina, que, assim que ouviu as mensagens enviadas pela filha, voltou para casa.
A festa de aniversário foi cancelada por causa do tiroteio. Naquela noite, a família inteira dormiu junta, sobre cobertores e tapetes, no chão da cozinha. Só assim a menina pegou no sono.
— Tenho pânico de tiroteio. Não me acostumo. Quando acontece e eu estou na escola, me jogo no chão, abraço meus amigos — diz a menina, que não vê a hora de voltar às aulas: — Tenho que estudar para realizar meus sonhos.
Sete mil alunos sem aula
Cerca de 7 mil alunos não tiveram aulas nesta quarta-feira por causa de tiroteios em favelas do Rio. Segundo a Secretaria municipal de Educação, a maioria das unidades escolares fechadas são na Zona Norte. No total, dez escolas, sete creches e cinco Espaços de Desenvolvimento Infantil (EDIs) não funcionaram.
Desde sexta-feira, dois inocentes foram mortos em tiroteios no Jacarezinho. Na terça-feira, o feirante Sebastião Sabino da Silva, de 46 anos, morreu vítima de bala perdida durante um tiroteio. Já o mototaxista André Luis Medeiros, baleado na sexta-feira passada, morreu nesta quinta-feira no Hospital municipal Souza Aguiar, no Centro, após ter ficado seis dias internado.
fonte: extra.globo.com
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