A Prefeitura de Ubatuba pretende cobrar uma taxa dos proprietários de casas de aluguel para temporada. O valor da cobrança ainda não foi definido, mas está amparado em uma lei municipal aprovada no fim de 2017. Segundo a Secretaria de Turismo, são cerca de 55 mil 'leitos informais' na cidade concorrendo com 16 mil da rede hoteleira. A principal ofensiva é contra sites intermediários para hospedagem, entre eles o Airbnb, Booking e o Alugue Temporada. Para a OAB, a lei pode ser considerada inconstitucional. (leia abaixo)
A lei é do executivo e foi aprovada na última sessão do ano passado pelo legislativo. O texto trata da regulamentação de hospedagem em casas a partir de três dormitórios. Com a regulamentação, o dono vai ter que abrir empresa para anunciar o imóvel, recolher ISS, ter contrato formal com a pessoa para quem está alugando e o imóvel vai ter que ter laudos da vigilância sanitária e bombeiros. O locador ainda vai ter que fornecer mensalmente uma lista dos usuários à administração.
Depois de cumpridas as exigências, o imóvel vai passar por uma fiscalização da prefeitura e, cumprindo as regras, tem o cadastro liberado – e passa a ter que pagar uma taxa ao município. Quem não se adequar pode ser multado.
A lei está em vigor desde dezembro, mas o cumprimento depende da publicação de um decreto que regulamenta os processos, valores das taxas e multas. O prazo para publicação é de 60 dias.
Concorrência
A Secretaria de Turismo informou que a lei é uma ofensiva contra a locação considerada ilegal e uma concorrência desleal à rede hoteleira formal. Segundo o levantamento da pasta, a cidade conta com 16 mil leitos cadastrados; 10 mil em pousadas ilegais e 45 mil em casas de temporada.
“Esse era um pedido da rede hoteleira contra a concorrência desleal. A cidade recebeu 400 mil turistas na cidade no fim de ano, mas a taxa de ocupação era de 70%. Estamos perdendo com isso, porque quem aluga dessa forma, não traz retorno em emprego e nem em impostos para a cidade. Existem pessoas com mais de dez imóveis só para esse tipo de serviço”, explica Luiz Bishof, secretário de turismo, que também é dono de uma pousada no Centro.
Bishof explica que a pessoa que morar na cidade e alugar apenas uma casa para complementação de renda não será taxada. Apesar disso, a lei especifica que todas as casas com três quartos serão incluídas na regulamentação.
Para garantir o cumprimento da lei, prefeitura informou que abriu concurso para agente de fiscalização em 2017 e vai usar também a atividade delegada da Guarda Municipal.
Após o fim do prazo para cadastro, o esquema de fiscalização vai se basear nos cadastros existentes em sites de anúncio de casas. De acordo com a administração, uma equipe de Tecnologia da Informação vai elaborar uma lista com os imóveis anunciados nas plataformas digitais. Essa lista será cruzada com os imóveis cadastrados e nos casos irregulares será aplicada multa. O valor também será definido pela regulamentação.
“O decreto vai oferecer tempo para regulamentação. Depois disso, vamos visitar esses imóveis e notificar os proprietários”, explicou o secretário de turismo.
Aplicativos
O secretário explica que os aplicativos de aluguel de casas fazem o que ele considera um 'comércio ilegal', porque as casas oferecem serviço de hotelaria, mas sem o pagamento de taxas. Os valores cobrados têm atrapalhado o comércio da cidade, que gera empregos, já que tem que competir com preços abaixo do mercado.
Em uma busca no Airbnb, um apartamento inteiro no Itaguá para quatro pessoas custa R$ 260 por noite, enquanto uma pousada, no mesmo bairro, para a mesma quantidade de hóspedes cobra R$ 360, segundo o site Booking.
“Eu tenho que pagar funcionário, a conta de água e luz são mais caras, preciso estar em dia com bombeiro vigilância, prefeitura, e tenho que concorrer com a pessoa que só paga a taxa do site? O Airbnb, Alugue Temporada e Booking não repassam nada para a prefeitura”, acrescenta Bishof.
Ele explicou que depois da aprovação da lei encaminhou aos sites cartas pedindo que as pessoas sem registro de CNPJ fossem retiradas do site, mas não tiveram retorno. A lei ainda exige que a empresa faça o cadastro junto à prefeitura para oferecer o serviço na cidade.
Para Hugo Galo, presidente do Convention & Visitors Bureau (UC&VB), que representa a rede hoteleira, a regulamentação é necessária para trazer segurança ao turista e para combater a concorrência desleal.
“A pessoa que aluga a casa não tem a segurança de que o imóvel corresponde às fotos, que ele vai estar lá para ser alugado. Por outro lado, o locatário entrega a casa na mão de uma pessoa que ele não conhece e põe a vizinhança em risco. Queremos que o cadastro traga a segurança de algo registrado e que também equipare as taxas para melhorar a concorrência de mercado”, explica Galo.
Dono de uma casa com quatro dormitórios, no bairro Maranduba, critica a prefeitura. "Me sinto lesado e não vou pagar taxa nenhuma. Eu acho que a prefeitura tem outras prioridades, não vejo o imposto revertido em melhorias para a cidade. Estou tão desconfortável com essa situação, que se eu pudesse, eu venderia o imóvel", disse o proprietário que pediu para não ser identificado. O aluguel deste imóvel que ele aluga atualmente é a renda única da família.
A reportagem do G1 procurou os sites para comentarem o assunto. O Alugue Temporada informou por nota que a lei é inconstitucional. “Trabalhamos para proteger o mercado de aluguel por temporada de regulamentações onerosas que comprometam os negócios dos proprietários e também impossibilitem os viajantes de aproveitar as vantagens de alugar por temporada”. O Booking não quis se pronunciar.
O Airbnb disse em nota que os anfitriões têm direito assegurado por lei para alugar suas propriedades por temporada, seguindo a regulamentação da lei do inquilinato. "As pessoas não podem estar sujeitas às mesmas regras de empresas e comércios ". A plataforma diz que acompanha a situação.
Inconstitucional
Para o presidente da comissão de direito eletrônico da Ordem dos Advogados (OAB) de São José dos Campos, Alexandre Tomás, a lei é inconstitucional. Para ele, o projeto fere o direito de propriedade ao regulamentar o uso do imóvel, que é garantido constitucionalmente.
“É uma tendência o poder público tentar regulamentar serviços de internet para não perder receita, mas ela precisa impor isso de forma melhor. Não dá para dizer que todas as casas a partir de três quartos terão que ser empresas. A pessoa é dona da casa, ela aluga na temporada, e depois aquilo é uma moradia. Não há como supor que isso é um serviço e cobrar como um hotel”, explicou.
Tomás ainda indica que as empresas e os donos de casas incluídas na lei que se sentirem lesados podem procurar a justiça e mover uma ação na justiça.
fonte: G1
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