Basta dar uma passadinha de olho em qualquer edição do Kama Sutra para, no mínimo, se admirar com a criatividade deVatsyayana, o autor desse guia universal das artes do amor. Além dos nomes mirabolantes para cada posição ("balanço de cavalo", "triângulo luminoso", "a união da borboleta" e "sanduicheira" são só alguns deles), muitas das posições são realmente desafiadoras. Vatsyayana costumava dizer que não foi ele quem inventou essas técnicas, e sim seu rival Suvarnanabha, que foi um dos autores de um extenso trabalho, quase enciclopédico, sobre o amor. Ao beber da fonte da obra do rival, Vatsyayana teria incorporado essas posições dificílimas em seu livro que, segundo ele, eram possíveis, desde que o casal "treinasse bastante".Mas por que um guia sobre o amor precisa de tantas manobras complicadas? É sabido que o povo indiano desenvolveu técnicas complexas de yoga, mas as propostas do Kama Sutra chegam a quase desafiar a gravidade. Certas posições encorajam que os casais se empilhem perigosamente um sobre o outro ou em objetos à disposição. Para Wendy Doniger, estudiosa do assunto, a inclusão das posições amalucadas não é apenas uma casualidade ou senso de humor estranho do autor: elas refletem uma particularidade do amor, que é a imaginação e a fantasia. Mais precisamente, as posições sexuais estranhas estão ali não necessariamente para serem testadas, e sim para inspirar o casal a explorar possibilidades. Muito mais do que uma cartilha física, é uma obra sobre a liberdade do sexo imaginado, sonhado.
Na edição original do Kama Sutra, Vatsyayana escreveu: "Toda paixão demanda variedade. É por meio da variedade que o casal inspira a paixão um pelo outro. É a variedade que faz com que cortesãs e amantes se tornem tão desejáveis ao outro". E talvez seja esse o grande trunfo do Kama Sutra: continuar alimentando as fantasias humanas, muitos séculos depois de sua publicação.
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