Cristina Santos joga. E joga muito. Conhecida na rede online do Xbox como "Olakristal", a paulista de 29 anos é uma gamer hardcore. Além de ser a mulher nº 1 de "gamerscore" (pontuação vinda de conquistas do Xbox) no Brasil, ela também já liderou o ranking mundial de "Super Street Fighter IV" com a lutadora Rose.
E não se importa com quem acha que ela não manja de videogames. "Se você é melhor do que alguém, vai incomodar. Se você for mulher, pior ainda".
Videogame é coisa de menina sim. Neste Dia Internacional da Mulher, o G1 conversou com mulheres que jogam e trabalham com jogos no Brasil, enfrentando preconceito e machismo por uma paixão que não tem gênero. Leia também a entrevista com Amora Bettany, artista do game "TowerFall".
Cristina entrou no mundo dos videogames daquele jeito clássico: jogando com os primos, "sendo enrolada para ficar de próxima", até que ganhou de Natal um Mega Drive, seu primeiro console.
Por conta da grande diferença de idade em relação às irmãs – "eu nunca brincava com elas porque são 15 anos mais velhas que eu" – os videogames cresceram em importância e acabaram se tornando seu principal hobby.
Depois do Mega Drive teve Super Nintendo, PlayStation 1 e 2. Mas foi no Xbox 360 que a "Olakristal" surgiu de vez e ficou conhecida na comunidade de jogadores.
Não é pouca coisa não. Entre 2013 e 2014, com o lançamento de "Super Street Fighter IV: Arcade Edition", Cristina alcançou a primeira posição no ranking online mundial da rede Xbox Live com a lutadora Rose. O feito, é claro, incomodou muita gente.
Existe machismo no 'Street Fighter'
"O pessoal via meu nome, via que era mulher e xingava nas mensagens. Como geralmente jogava de madrugada, quando acordava no dia seguinte o meu perfil estava cheio de caras me esculachando", conta ao G1.
"O pessoal via meu nome, via que era mulher e xingava nas mensagens. Como geralmente jogava de madrugada, quando acordava no dia seguinte o meu perfil estava cheio de caras me esculachando", conta ao G1.
"Super Street Fighter IV" tem um ranking individual para cada lutador. Por isso, para subir na tabela, é preciso acumular vitórias seguidas com o seu personagem favorito. O páreo é duro, e quem levava a pior dificilmente aceitava bem a derrota.
"Alguns te elogiavam e entravam de novo para jogar porque a partida era bem disputada e valia a pena. Mas era mais fácil rolar elogio de gringo, mesmo em partida valendo ponto, do que de brasileiro. O pessoal daqui pegava birra e negativava seu perfil".
Por causa desses incidentes, Cristina diz ter perdido a vontade de jogar "Street Fighter IV" competitivamente. Porém, ela não deixou a experiência ruim estragar o que gosta de fazer. "Conheci muitos amigos, uma galera super do bem. Os 'haters' existem. Mas tem que ignorar, bloquear e deixar de lado. É diversão em primeiro lugar".
Mas o viés para "Street Fighter IV" vinha de outra competição, que ainda está longe de morrer. E se a Rose brasileira se aposentou, a "Olakristal" caçadora de conquistas segue mais viva do que nunca.
O que são conquistas?
Uma das principais novidades do Xbox 360 lá em 2005 foi seu sistema de conquistas, ou "achievements", que premia o jogador com pontos após ele completar tarefas dentro dos games. Essa pontuação se acumula e forma o "gamerscore" de cada um.
Uma das principais novidades do Xbox 360 lá em 2005 foi seu sistema de conquistas, ou "achievements", que premia o jogador com pontos após ele completar tarefas dentro dos games. Essa pontuação se acumula e forma o "gamerscore" de cada um.
A brincadeira é totalmente opcional. Mas rapidamente virou coisa séria para muitos jogadores, que competem para ver quem soma mais pontos e consegue 100% no maior número de games.
Para você ter uma ideia, uma das conquistas mais casca grossa da história do Xbox 360 continua sendo "Seriously...", do primeiro "Gears of War" (2006). A tarefa? Matar 10 mil inimigos em partidas multiplayer ranqueadas.Estavam criados os caçadores de conquistas, categoria da qual Cristina faz parte com muito orgulho. Hoje ela é a mulher de maior "gamerscore" no Brasil, com mais de 267 mil pontos em sua conta.
O número é fruto de quase seis anos jogando mais de 600 games no Xbox 360 e Xbox One. No ranking brasileiro, ela está entre os 15 mais bem pontuados, o que também dá inveja em muito machão de plantão.
O caminho da conquista
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Cristina fala do jogo mais divertido de fazer todas as conquistas e compartilha a tarefa que mais deu trabalho:
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'Enslaved: Odyssey to the west'
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"Amo a história, o entrosamento dos personagens, a jogabilidade. É um game não muito divulgado e que gostei bastante. E a DLC é fantástica, traz uma experiência totalmente nova. Gostei muito de fazer 100%."
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'Dead Space 2'
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"Você precisa terminar no modo 'hardcore' salvando só três vezes o jogo, que contém 15 capítulos. Nesse modo, você não tem acesso aos 'upgrades' da armadura e das armas da campanha anterior, então tem que evoluir tudo do zero. É tenso."
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"Tem cara que fala que minhas conquistas são bugadas. Que tem como fazer no computador. Mas eu estou totalmente tranquila", diz. "Já vi pessoas do nada terem 30 jogos completos em um dia. Aí não dura muito tempo. A Microsoft descobre e bane por trapaça", diz.
"O preconceito sempre vai existir. Mas existem pessoas melhores que você em tudo que você for fazer na vida, tanto homem quanto mulher. Não dá para ser bom em tudo. Se você é melhor do que alguém, vai incomodar. Se você for mulher, pior ainda".
Mas é só pela pontuação?
Claro que não. Cristina continua jogando e caçando conquistas porque, para ela, os "achievements" acabam sendo um histórico de todas as experiências que você teve com seu videogame. "O 'gamerscore' é seu currículo, a quantidade de jogos que você tem conhecimento. Eu acho legal você jogar um game e ganhar algo em troca, que vai somando em seu perfil".
Claro que não. Cristina continua jogando e caçando conquistas porque, para ela, os "achievements" acabam sendo um histórico de todas as experiências que você teve com seu videogame. "O 'gamerscore' é seu currículo, a quantidade de jogos que você tem conhecimento. Eu acho legal você jogar um game e ganhar algo em troca, que vai somando em seu perfil".
A missão do caçador de conquistas, no entanto, pode ser ingrata. Vale tudo para bombar o placar e somar alguns pontinhos: desde combinar com amigos para acumular mortes com certo tipo de arma, até encarar títulos esdrúxulos que em situações normais de pressão, volume e temperatura você passaria longe.
"Geralmente eu jogo um game bom e dois ruins para fazer conquistas. Mas teve uma época que eu peguei muito jogo ruim. Daí fica cansativo", diz Cristina. "Hoje não tenho muita paciência. Prefiro curtir o game, entender melhor ele, para depois voltar e tentar fazer outras conquistas".
Mas mesmo transitando em uma comunidade que costuma se ajudar para desbloquear mais e mais feitos, Cristina lamenta a forma como muitos jogadores ainda enxergam a mulher que joga bem e bastante.
"São poucos os caras que elogiam e aceitam de boa. Geralmente são os caras mais cabeça. Legal, que bom que uma mulher é melhor do que eu. São caras bem resolvidos. São poucos, mas existem".
Mulheres gostam de jogar como mulheres
Fã de jogos de aventura, e em especial da heroína Lara Croft e de "Tomb Raider", Cristina acredita que um dos caminhos para aumentar a representatividade das mulheres no mundo dos videogames é, justamente, trazer mais personagens femininos que fogem do estereótipo de "donzela em perigo".
Fã de jogos de aventura, e em especial da heroína Lara Croft e de "Tomb Raider", Cristina acredita que um dos caminhos para aumentar a representatividade das mulheres no mundo dos videogames é, justamente, trazer mais personagens femininos que fogem do estereótipo de "donzela em perigo".
"Gosto daquele 'Remember Me', fiz 1 mil pontos nele. Acho bacana essa visão. De ser uma personagem forte, determinada, esforçada. Meio que se vira nos 30", afirma. "Sempre que tiver uma protagonista mulher, tento ao máximo jogar e experimentar. Porque a maioria é homem. Então se for mulher é muito provável que eu vá jogar".
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