Linha de produção da Kombi, em São Bernardo do Campo. Foto: Divulgação
O engenheiro Leulane Rocha na foto com o pai e com o neto próximo da kombi. Foto: Warley Leite
Donos de Kombi lamentam aposentadoria do modelo, lembram histórias engraçadas, mas admitem: carro foi longe demais
Xandu AlvesSão José dos Campos
Ela é a “sogra” do mundo motorizado: rechonchuda,marrenta e capaz de levar todo mundo, até aquele genro mais chato. A Kombi está para os veículos como a sogra para a família.
O modelo mais longevo da história da indústria automotiva mundial, lançado em 1950 na Alemanha e produzido hoje apenas no Brasil, vai pendurar os pneus.
A legislação brasileira obriga que, a partir de 2014, freios ABS e air bags equipem todos os veículos.
A Volkswagen não encontrou uma solução comercialmente viável para dotar a Kombi desses itens. Ficaria caro demais. A montadora deve colocar no mercado, ainda este ano, a Transporter, sucessora da Kombi (veja quadro ao lado).
Seguidores. Então, os fãs ficarão órfãos da velha e saudosa Kombi? Nada disso. A morte da “sogra” não vai ser tão lamentada assim.
E isso não é piada.
Mais do que o futuro, é o passado que interessa aos aficionados pelo veículo, que embalou hippies nos anos 60, inaugurou o transporte alternativo e levou milhões de sogras, genros, cunhados e agregados às praias nos finais de semana.
“Acho que ela foi até longe demais”, diz Remi Rodrigues, 47 anos, restaurador de carros antigos de Santa Catarina e dono de uma Kombi Luxo 1969.
Para ele, a posição de dirigir da Kombi é sem igual. “Parece que a gente esta sentado em uma cadeira e a visão daquele vidro repartido ao meio é só dela.”
Alegria. Cada motorista tem a sua história particular com a ‘Kombosa”, um dos vários apelidos que o modelo recebeu ao longo dos anos.
“Circo” bem poderia ser o nome da Kombi do aposentado José Augusto Pereira, 66 anos, de São José dos Campos.
Toda decorada e colorida, a Kombi serve de transporte, depósito e camarim para a identidade (nada) secreta de Pereira. Há 15 anos ele é conhecido como ‘Palhaço Frigideira’.
“Ela me leva para os shows. Ando ainda em vários lugares e sou reconhecido pelo veículo”, conta Frigideira, que colocou um nariz de palhaço bem na frente da Kombi. “Ela e eu somos só alegria.”
O engenheiro mecânico Leulane Rocha, 45 anos, revive as melhores recordações da infância quando entra na Kombi 1975 que guarda na garagem.
Toda restaurada e original, ela é o encanto da casa. Leva a família do engenheiro para todo lado e virou xodó do netinho Henry Luis, de 2 anos.
“Tenho ótimas lembranças da minha infância com a Kombi. Passei muito tempo andando nela com meu pai e tio. Não vendo meu modelo por nada.”
Paixão. A cor vinho é bem apropriada para o tamanho da paixão que Jaime Santos, 37 anos, tem pela Kombi Carat 99, modelo de uma série especial. Por onde passa, o carro chama a atenção. “Vendo outros carros que tenho, mas não a minha Kombi”, garante ele.
Jaime Camillo com sua Kombi modelo Carat 1999. Foto: Warley Leite
Funileiro cria carro com TV, sofá, som e até teto solar
São José dos Campos
O funileiro Cristiano Ferreira de Oliveira, 35 anos, de Taubaté, comprou a carcaça de uma Kombi 1965 por R$ 200 em um desmanche. O que sobrava do veículo seria desmantelado e vendido por quilo.
A “loucura” ocorreu em 2009, pouco tempo depois de Oliveira encasquetar com a miniatura de uma Kombi totalmente rebaixada que comprara para o filho.
Ele gostou tanto do brinquedo que resolveu fazer um em escala 1:1. Ou seja, queria “fabricar” a sua própria Kombi.
Foram quatro anos de trabalho duro, dinheiro gasto em peças e muitas mudanças na estrutura do veículo, cuja carroceria foi alargada em 22 centímetros para ficar do jeito que o funileiro queria.
“Ficou pronta em 8 meses. Ao todo, gastei R$ 50 mil na minha Kombi, que entrou para a família”, diz Oliveira, que agora está recuperando uma Kombi 1974 para deixá-la original.
Sala. O modelo adaptado ganhou pintura preta e vermelha, rodas de aro 18, teto solar e nada menos que uma sala no lugar do banco dos passageiros. O ambiente abriga uma TV de 32 polegadas e um sofá bege, além de sistema de som.
A Kombi customizada de Oliveira já foi capa de revista especializada e agora vai a campeonatos. Só uma coisa ele não faz: vender a criação.
Jaime Camillo com sua Kombi modelo Carat 1999. Foto: Warley Leite
SERVIÇO
SDS tem 'Kombi da esperança' em São José
São José dos Campos
Ele estava quase desistindo da vida quando viu uma Kombi branca se aproximar.
Morando na rua havia 15 anos e dependente químico, S.R.O., 33 anos, admite: não encontrava motivo para continuar vivendo.
“Minha família havia me abandonado. Eu não sabia mais o que fazer. Estava no fundo do poço”, conta.
Numa noite em meados de 2011, o morador de rua foi procurado pelos agentes educadores do serviço de abordagem social da Secretaria de Desenvolvimento Social de São José.
Ele andam em uma Kombi pela cidade, 24 horas por dia, sete dias por semana, tentando convencer moradores de rua a aceitar o tratamento.
Foram necessárias seis visitas a S. para que o dependente topasse se tratar. Desde então, eles está limpo e em franca recuperação.
Admite que, em seu caso e de dezenas de outros dependentes, a Kombi branca da SDS representa a esperança.
“Voltei a ser alguém depois que aceitei entrar naquela Kombi. Era a última tentativa do pessoal da abordagem. Alguma coisa tocou meu coração e me fez mudar de vida”.
O restaurador de carros antigos Remi Gonçalves ao lado de uma kombi. Foto: Divulgação
http://www.ovale.com.br/nossa-regi-o/fim-da-kombi-deixa-legi-o-de-motoristas-orf-os-no-vale-1.369034
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