Com provavelmente dois anos e meio de mandato pela frente,Michel Temer recebe um governo com tripla crise: econômica, política e administrativa. Os números mostram um país paralisado desde 2015, cuja presidência Dilma Rousseff recebeu na forma de um segundo mandato, mas que ela governou muito pouco ou quase nada.
Agora afastada, Dilma deixa para Temer uma Esplanada dos Ministérios em descompasso. Sem dinheiro, muitos ministérios,embora com uma folha de pagamento gigante, têm pouco a fazer. O Itamaraty, por exemplo, atrasa alugueis no exterior e sofre até com falta de papel higiênico. Temer pega um governo de cofres vazios e um país mais vigilante contra manobras fiscais e menos tolerante com aumentos de tributos.
Os números são claros. É possível que Temer retome a governabilidade e tenha amplo apoio de políticos e empresários? Sim. Mas, antes, precisará de dinheiro. Em março, o governo levou ao Congresso uma previsão de déficit na meta fiscal em R$ 96 bilhões. Temer terá, de imediato, a missão de aprovar esse projeto no Congresso. Embora esse valor como déficit seja astronômico, o valor inicial era um superávit de R$ 24 bilhões – a lei obrigaria o governo a praticamente parar para tentar se aproximar dessa meta. Ou seja, o rombo é inevitável. É com esse cenário que Temer deverá, ao mesmo tempo, tentar frear a queda na economia e atender ao apetite por cargos e espaço do PMDB. Para piorar, o governo Dilma superestimou em algo como R$ 90 bilhões a arrecadação para este ano.
Além disso, a margem para manobra é pequena. Isso porque embora o orçamento tenha o gigantismo da casa do trilhão, os gastos com a dívida, pessoal e a previdência consomem boa parte desse montante. Em 2015, por exemplo, o gasto com funcionários foi o maior em 17 anos, representando quase 40% das receitas. Não bastasse o desequilíbrio fiscal, Temer terá ainda o rombo da previdência, um problema histórico que Dilma se empenhou pouco em resolver. A estimativa para este ano é de um déficit de R$ 133 bilhões. Os números mostram que a situação da previdência é insustentável, mas lidar com o tema exige que o governante entre numa discussão sobre aposentadorias e adote medidas impopulares. Temer estará disposto a ter esse desgaste?
Na economia real, o país está em frangalhos. Quando Lula enfrentou uma crise, sua solução foi incentivar o consumo. Temer, no pós-Dilma, não conta com essa arma em seu limitado arsenal. A inflação ainda está alta demais para permitir queda significativa da taxa de juros. E as contas públicas destroçadas não admitem que o governo conceda benesses tributárias nem linhas de crédito subsidiadas.
Os números permitem resumir o governo Dilma de forma bem simples, sobretudo desde o ano eleitoral: uma gastança desmedida. Em algum momento, essa conta chegaria. Ela ajudou a derrubar Dilma, e também afetará Temer. O presidente interino se beneficiará, nos próximos meses, de um pequeno arrefecimento da crise, que viria com ou sem mudança. A inflação reduz o ritmo, porque a intensidade da crise esfria o consumo e dificulta elevações de preços. O nível de atividade vai parar de cair e talvez cresça um pouco, simplesmente porque a base de comparação, nos trimestres anteriores, é ruim demais. Mas isso não eximirá o governante de adotar medidas concretas.
Muitas dessas medidas, contudo, precisam do apoio do Congresso e do empresariado – um fracasso duplo do governo Dilma. A principal cartada da presidente era aumentar a receita por meio da CPMF. Fracassou. Temer também terá dificuldades. Terá de viabilizar, na política, as soluções para a economia. Nos 13 anos de PT, a governabilidade foi feita à base de cargos e fisiologismo político – incluindo ainda o apetite insaciável do PMDB de Temer.O resultado foi uma Esplanada dos Ministérios inchada e cara. A sede do PMDB não mudará com Temer no poder. Pelo contrário, agora em carreiro solo, longe dos acordos com o PT, o PMDB terá mais espaço para preencher na Esplanada. E isso pode custar caro para a economia – exatamente como custou nos anos de Dilma. Como Temer conseguirá aliar seus interesses políticos, agradando partidos de centro, direita e nanicos, e ao mesmo tempo, fazer um forte ajuste na economia? O cenário pós-Dilma não será nada fácil.
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