A montadora japonesa, acostumada a vender sem muita dificuldade, teve de rever sua estratégia por conta do desempenho comercial decepcionante do Etios. Saiba como o presidente Steve Angelo convenceu os japoneses que era preciso mudar
Quando assumiu o comando da Toyota na América Latina, em 2013, o executivo americano Steve Saint Angelo tinha pouco conhecimento sobre o mercado automotivo brasileiro. Sua primeira iniciativa à frente da companhia foi buscar todo tipo de informação que poderia para entender as particularidades do mercado nacional. E com razão. Um ano antes, a montadora japonesa havia lançado o Etios, carro compacto que representou o ingresso da empresa ao concorrido segmento de veículos populares, o mais importante para as montadoras no País, e seu desempenho comercial foi decepcionante.
A previsão era comercializar 100 mil unidades no ano seguinte, mas apenas 62 mil veículos foram emplacados. Logo após seu lançamento, a Toyota se viu obrigada a fazer investimentos em campahas publicitárias para tentar impulsionar a novidade. “Pedi para reunirem todos os artigos que haviam saído na imprensa sobre o carro”, afirma Angelo. “Eu precisava saber o que as pessoas achavam dele.” De forma geral, as avaliações eram negativas. O design exterior não agradava, o estilo do painel – que tem um velocímetro que lembra o ponteiro de uma balança antiga de mercearia – assustava os consumidores, o acabamento espartano deixava a desejar e detalhes como a falta de pintura na parte interna do capô se sobressaíam sobre o bom desempenho do motor.
“Ao dirigi-lo, no entanto, percebi que se tratava de um bom automóvel”, defende o executivo. No início de abril, a Toyota apresentou uma nova versão do Etios. Mais de 600 componentes do veículo foram alterados, desde itens simples, como uma antena menor, até questões mais complexas, como a introdução do câmbio automático. Trata-se do resultado de um árduo trabalho de convencimento conduzido por Angelo, junto à matriz japonesa, da necessidade de se alterar profundamente o projeto, algo raro nos modelos da marca. Seus carros de maior sucesso, como o Corolla e a picape Hilux, líderes em seus segmentos, possuem grande prestígio e consumidores cativos.
No caso do Etios, havia a necessidade de reforçar a confiabilidade e o baixo custo de manutenção e revisão do veículo. Angelo usou esses números para justificar a necessidade de mudanças, mas não se limitou aos dados. Ele também apelou para o “toyotismo”, modelo de produção criado pelos japoneses no final da Segunda Guerra e responsável pela rápida ascensão da montadora, que atualmente é comandada por Akio Toyoda, neto do seu fundador, Kiichiro Toyoda. “A direção podia ver, pelas vendas, que o carro não estava sendo aceito. Mas, para me comunicar de uma forma que todos entendessem, usei como argumento as práticas de negócios da Toyota”, diz.
Um dos princípios do “toyotismo” é o chamado Controle de Qualidade Total. O conceito introduziu na indústria a ideia da orientação ao cliente e da qualidade em primeiro lugar. “O desenvolvimento do carro foi bem feito. Mas, o time responsável não entendeu o consumidor”, diz o executivo. Angelo assumiu o cargo em abril de 2013. Em setembro, seis grandes alterações já haviam sido incorporadas ao carro, incluindo a pintura da parte interna do capô. Alguns desafios foram surgindo, como a substituição da antena do rádio.
“Achei que era só trocar o modelo, mas não é bem assim, tem uma série de requisitos para cumprir”, diz. O novo sistema de ajuste dos bancos demandou mudanças estruturais. Essa remodelação se fez ainda mais necessária em virtude de mudanças no mercado. “O segmento de entrada vem perdendo importância”, afirma Valdner Papa, consultor automotivo e professor das faculdades FAAP e ESPM. “Hoje a demanda é por carros que tenham tecnologia e conectividade.” Esse movimento acontece há, pelo menos, quatro anos. Segundo dados da Fenabrave, entidade que representa as montadoras, a participação do segmento de entrada nas vendas de veículos caiu de 32,72% em 2011, para 23,4% no ano passado.
Já o chamado hatch pequeno, segmento imediatamente acima, passou de uma participação de 17,2% para 23,57%, no mesmo período. A Toyota parece estar disposta a monitorar mais de perto o consumidor brasileiro. O País foi o primeiro destino da montadora quando ela se aventurou fora do Japão, em 1958. Apesar disso, sua participação no mercado nacional sempre ficou limitada a não mais do que 5%. Nos últimos anos, ela vem trabalhando para mudar esse cenário. Ao mesmo tempo em que Angelo assumia o comando na América Latina, Mark Hogan, ex-executivo da GM que trabalhou no Brasil nos anos 1990, passava a integrar o conselho da companhia com a missão de guiar a empresa na região, a pedido de Akio Toyoda.
A meta, agora, é vender 68 mil unidades do Etios, em 2016, o que faria a participação da Toyota no segmento passar dos atuais 3% para 8%. Em 2014 foram 66 mil e, no ano passado, 61 mil Etios vendidos. “Agora temos uma voz forte na região”, diz Angelo. Nesta semana, a montadora inaugura uma nova fábrica de motores, em Porto Feliz (SP), que vai fornecer os propulsores para o compacto. Considerada a mais moderna do grupo, ela é mais um exemplo da importância que o Brasil tem para a companhia. Quem dará a última palavra, no entanto, será o consumidor.
fonte:
Comentários